Países
da América Latina tiram milhões da pobreza com políticas sociais e
possibilitam que muitos outros cheguem à classe média, segundo Informe
sobre Desenvolvimento Humano 2013 do Programa das Nações Unidas para o
Desenvolvimento (Pnud). No entanto, persistem o desafio de ampliar a
queda da desigualdade e elevar as práticas sustentáveis da sociedade.
Cidade do México - Nas últimas décadas, países da América Latina
e outras regiões em desenvolvimento têm alcançado avanços
impressionantes em desenvolvimento humano, tirando centenas de milhões
de pessoas da pobreza e possibilitando o surgimento de bilhões a uma
nova classe média global, afirma o Informe de Desenvolvimento Humano
2013, lançado na Cidade do México pela diretora do Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento (Pnud), Helen Clark, e o presidente do
México, Enrique Peña Nieto.
O IDH 2013, intitulado "A ascensão do Sul: progresso humano num mundo
diverso", analisa mais de 40 países em desenvolvimento, que chamam "o
Sul", e que têm conseguido um rápido avanço no desenvolvimento humano
nos últimos anos. O Índice elogia os programas sociais inovadores
aplicados na América Latina, em particular aqueles dirigidos a reduzir a
pobreza e as desigualdades históricas, como o "Oportunidades" do México
e o "Bolsa Família" do Brasil.
"O desenvolvimento econômico por si só não leva automaticamente a
avanços no campo do desenvolvimento humano", aponta Helen Clark, no
prólogo do informativo. "As políticas dirigidas aos pobres e os
investimentos significativos nas capacidades das pessoas, focadas na
educação, alimentação e saúde, além de formação profissional, podem
ampliar o acesso a um trabalho digno e ajuda a progredir de maneira
consistente".
"A ascensão do Sul é um dos feitos mais notáveis do novo cenário
mundial", disse Heraldo Muñoz, diretor do Pnud para América Latina e
Caribe. "Entre 40 países de diversas regiões ao redor do mundo, o índice
deste ano destaca a América Latina, especialmente Brasil, Chile e
México, considerados pioneiros nos três motores do desenvolvimento:
maior proatividade do Estado nas políticas de desenvolvimento, maior
integração com os mercados globais, e sobretudo inovação exemplar nas
políticas sociais"
No Brasil, por exemplo, a porcentagem da população que vive com menos
de 1,25 dólar/dia caiu de 17,2% para 6,1% entre 1990 e 2009. O país tem
alcançado quatro de seus oito Objetivos de Desenvolvimento do Milênio
antes do prazo estabelecido para 2015 e está em bom caminho para atingir
os outros quatro a tempo.
Para 2030, América Latina e o Caribe serão o lar de um de cada dez
membros de uma classe média global emergente. Bilhões de pessoas de todo
o mundo estão cada vez mais formados, socialmente comprometidos e
internacionalmente interconectados. Quatro dos cinco países com o maior
número de usuários no Facebook encontram-se no Sul : Brasil, Índia,
Indonésia e México.
Segundo o informe, o crescimento da América Latina tem sido liderado
por estados fortes que tem experimentado uma integração gradual e
sequencial na economia mundial. Enquanto o Brasil seguiu experimentando
estratégias econômicas dirigidas ao mercado interno, as empresas
nacionais também foram incentivadas a exportar e competir mundialmente.
A empresa brasileira Embraer, por exemplo, é agora a principal
produtora mundial de aeronaves de médio porte. Chile fomentou o
investimento em setores nos quais o país já contava com uma vantagem
comparativa, como o vinho, produtos madereiros e aquicultura, que
posteriormente impulsionaria o emprego no sul rural do país.
A inovação nos programas sociais também é outra característica dos
estados que tem tido tal evolução positiva, segundo conclui o informe.
"O ascensão do Sul está dando lugar a uma agenda social e de redução da
pobreza mais ampla, entende-se que as políticas para resolver as
desigualdades, as falhas institucionais, as barreiras sociais e a
vulnerabilidade das pessoas são tão importantes quanto a promoção do
crescimento econômico", diz o informe.
Os conhecidos programas de distribuição condicionada de dinheiro da
América Latina, como o Bolsa Família do Brasil, Oportunidades no México e
Chile Solidário, por exemplo, têm contribuído para estimular uma
distribuição mais equitativa das oportunidades socioeconômicas. Os
programas de distribuição estão delineados para aumentar a renda das
pessoas e seu acesso à saúde e educação, e tal distribuição é feita
mediante troca de alguns pontos como ajudar um centro de saúde e dar
assistência a uma escola.
Estes programas custam menos que 1% do PIB. Os êxitos na política
social da América Latina estão se emulando cada vez mais em outras
regiões. O prefeito de Nova York, Michael Bloomberg, viajou até o México
para estudar o programa "Oportunidades" antes de lançar o "Opportunity
NYC: Family Rewards", o primeiro programa de distribuição de renda dos
EUA.
"Enquanto estávamos desenhando o Family Rewards, baseamo-nos nas lições
aprendidas no Brasil, México, e outra dezena de países", aponta
Bloomberg no Informe de 2012 sobre o Desenvolvimento Humano. "Ninguém
tem o monopólio das boas ideias".
O Brasil, por exemplo, tem trabalhado com governos africanos para
adaptar seus programas de ajuda escolar, campanhas de alfabetização e
projetos de saúde pública às necessidades e circunstâncias locais. Em 2011, contava com 53 acordos bilaterais sobre saúde com 22 países africanos.
Apesar disso, o informe destaca que ainda falta muito a fazer. "Nos
próximos anos, os políticos dos países em desenvolvimento terão que
seguir uma agenda ambiciosa que responda às difíceis condições mundiais,
especialmente a desaceleração econômica, que tem diminuído a demanda do
Norte. Ao mesmo tempo, deverão tratar suas próprias prioridades
políticas mais urgentes."
América Latina tem visto como a desigualdade de renda caiu na maioria
dos seus países desde 2000, em grande medida devido às iniciativas
nacionais de luta contra a pobreza, mas seguem com a distribuição de
renda mais desigual de todas as regiões do mundo.
"No Brasil, ao menos uma quarta parte da desigualdade de renda está
associada com circunstâncias familiares, como a formação escolar dos
pais, a raça ou etnia, ou o lugar de nascimento. Tal persistência destes
padrões de distribuição de renda social se fazem patentes no Chile e
México, se bem que este último tem aumentado a mobilidade social nos
últimos anos", ressalta o informe.
Outro desafio analisado pelo Pnud é o da sustentabilidade. O informe
mostra que os desafios ambientais são bases de uma séria ameaça ao
desenvolvimento: cerca de 3.100 milhões de pessoas viverão na extrema
pobreza de recursos em todo o mundo em 2050 no cenário de desastre
ambiental que foi examinado, 155 milhões deles na América Latina e
Caribe.
Os governos e as empresas latino-americanas estão cooperando para
desenvolver e compartilhar novas tecnologias que respeitem o meio
ambiente, pondo a América Latina na vanguarda. Brasil está investindo
bilhões em energias renováveis, e o México aprovou recentemente a
primeira lei climática nacional integral do mundo, com objetivos de
reduzir as emissões de CO2 e a dependência do petróleo para o transporte
e obtenção de eletricidade.
As cada vez mais ativas organizações sociais estão fechando a brecha
entre cidadãos e governos na América Latina, assim como em outras
regiões. Tal como mostra o Informe, estas organizações vão desde
movimentos sociais até grupos dedicados à defesa de temas concretos,
passando por sindicatos e grupos comunitários. No Brasil, por exemplo, o
movimento Sanitarista dos profissionais da saúde desempenha um papel
fundamental para desenvolver o sistema sanitário público do país e
ampliar os serviços prestados aos pobres.
Ainda que se busquem novas formas de envolver os cidadãos no processo
de tomada de decisão, os governos da América Latina e de outros tantos
países do Sul também estão trabalhando em formas de obter maior
participação nas decisões na esfera mundial. A criação do G 20 é um
primeiro passo, tal como reconhece o Informe sobre Desenvolvimento
Humano, mas não é suficiente.
"As principais instituições internacionais precisam ser mais
representativas, transparentes e responsáveis", diz ainda o Informe. "A
Bretton Woods, os bancos de desenvolvimento regional e inclusiv o
próprio Sistema das Nações Unidas encontram-se em risco de perder a
relevância se não conseguirem representar adequadamente a todos os
estados membros e a todos seus cidadãos".
Mesmo que as instituições de governança global amiúde pareçam ser
ineficazes, há algumas novas que estão florescendo no Sul. Os acordos
comerciais regionais têm se ampliado e aprofundado na África, Ásia e
América Latina, inclusive apesar da estagnação das negociações
comerciais mundiais da Ronda de Doha.
A região também tem criado novas instituições para o desenvolvimento e
assistência econômica, incluindo o Fundo Latino-americano de Reserva e o
CAF (Corporación Andina de Fomento), um banco de desenvolvimento
latino-americano. O paradigma do sistema multilateral de acordos
políticos e econômicos globais e regionais está beneficiando o terreno
para o que o Informe denomina como "plutalismo coerente", com diferentes
estruturas internacionais que cooperam para realização de objetivos
comuns.
Ainda segundo o informe, os países em desenvolvimento também são cada
vez mais importantes nos mercados do Norte. Nos últimos cinco anos, por
exemplo, as exportações dos EUA para países desenvolvidos, membros da
Organização de Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE) aumentou
somente 20%, enquanto as exportações à América Latina e Caribe
aumentaram em mais de 50%.
A lição, conclui o informe de 2013, é bem simples: "O Sul precisa do Norte, mas cada vez mais, o Norte também precisa do Sul".